Cheque assinado pelo PMDB e disposição do ministro relator em acelerar trâmite agitaram o processo na Justiça Eleitoral; cassação do presidente é um dos desfechos possíveis
Os últimos dias trouxeram movimentações importantes no processo que pede ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) a cassação da chapa eleita na eleição presidencial de 2014, que poderia destituir Michel Temer do Palácio do Planalto.
O pedido, hoje composto por quatro ações que tramitam em conjunto, foi feito pelo PSDB poucas semanas após a reeleição da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2014. Naquela época, os tucanos haviam perdido a disputa eleitoral e faziam oposição ao governo. Hoje, detêm três ministérios e outras posições importantes na gestão Temer.
O processo alega que a eleição da chapa Dilma-Temer teria ocorrido por meio de diversas fraudes. Uma das acusações afirma que a campanha teria sido financiada com dinheiro desviado de corrupção na Petrobras.
Novidades
O CHEQUE DO PMDB
Uma das bases dessa acusação é um depoimento do ex-presidente da empreiteira Andrade Gutierrez, Otávio Azevedo, prestado ao próprio TSE. Azevedo disse que sua empresa deu R$ 1 milhão ao diretório nacional do PT em março de 2014, a título de propina de 1% por contratos mantidos com o governo federal, que teriam sido repassados à campanha de Dilma em julho.
Na terça-feira (8), contudo, a defesa da ex-presidente apresentou ao tribunal cópias de um comprovante de doação da Andrade Gutierrez ao PMDB, no valor de R$ 1 milhão, em 10 de julho de 2014, e de um cheque assinado na mesma data pelo diretório nacional peemedebista, destinando essa quantia à campanha do vice-presidente Michel Temer.
Por esse motivo, Azevedo foi convocado para prestar um novo depoimento ao TSE na próxima quinta-feira (17). A defesa de Dilma afirma que ele mentiu na sua declaração anterior. O ministro relator do caso, Herman Benjamin, quer ouvir o que o ex-presidente da empreiteira tem a dizer a respeito.
“Quem recebeu esse valor [R$ 1 milhão] na mesma data que ele disse foi o PMDB. Se ele afirmar [ao TSE] que se tratou de uma doação regular, não tem que discutir qualquer irregularidade na campanha. Esse documento [o cheque] é bom para a defesa de Dilma e de Temer”, diz ao Nexo Flávio Caetano, advogado da ex-presidente.
O presidente Michel Temer, por meio de seu porta-voz, Alexandre Parola, negou irregularidades. Disse que se travava de uma doação legal do diretório nacional do partido à campanha de 2014.
Tramitação ágil
O processo que pede a cassação da chapa Dilma-Temer evoluiu de forma errática no seu início, mas agora está em ritmo mais acelerado a caminho de uma conclusão pelo TSE.
A ação principal foi arquivada em fevereiro de 2015, por falta de fundamentação, e reaberta oito meses depois, em outubro. Em março deste ano, a Corte juntou ao mesmo processo três outras ações movidas pelo PSDB, que também pediam a cassação da chapa eleita em 2014.
O processo avançou de forma lenta no primeiro semestre de 2016, parcialmente em função de diversas petições que solicitaram a inclusão de novas provas apuradas pela Operação Lava Jato. O mandato da antiga ministra corregedora, Maria Thereza de Assis Moura, terminou em 2 de setembro, e o novo ministro corregedor, Herman Benjamin, assumiu o caso e deu sinais de que pretende acelerar a conclusão do processo.
Desfechos possíveis
INOCENTA A CHAPA OU APLICA PENA MAIS SUAVE QUE CASSAÇÃO
Esta é a saída desejada por Temer e Dilma. Ambos afirmam que não houve irregularidades no financiamento da campanha de 2014 e ressaltam que as contas da chapa já haviam sido aprovadas pelo próprio TSE.
SEPARA A RESPONSABILIDADE E PUNE SOMENTE DILMA
Esse resultado deixaria Temer satisfeito, mas não Dilma. A defesa do peemedebista afirma que as contas de campanha do PMDB eram separadas da do PT e que, portanto, a responsabilização deveria ser dividida: se o TSE julgar que houve ilegalidades, isso deveria resultar na condenação somente da petista.
A jurisprudência da Corte, contudo, vai no sentido contrário: comprovadas as ilegalidades na campanha vencedora, o cabeça de chapa e o vice são cassados. Além disso, eventual decisão separando as responsabilidades pode afetar governadores e prefeitos eleitos, com aumento de instabilidade nas chapas — segundo esse entendimento, todos os vices seriam potencialmente beneficiados pela cassação dos titulares.
O jornal “Valor” informou que dois dos sete ministros do TSE tendem a apoiar a separação de responsabilidades — Gilmar Mendes e Luiz Fux — e que há chance de atrair um terceiro para essa posição, Napoleão Nunes Maia Filho. Os três ministros, contudo, seriam insuficientes para formar maioria a favor do presidente.
Outros dois ministros, que não declaram voto a respeito, terão seus mandatos encerrados no primeiro semestre de 2017 — Henrique Neves, em 16 de abril, e Luciana Lóssio, em 5 de maio. Se o julgamento for postergado até depois dessas datas, o governo teria condições de tentar influir na escolha dos dois novos ministros da Corte antes da decisão final sobre o caso, segundo o “Valor”.
PUNE A CHAPA COMPLETA E CASSA O MANDATO DE TEMER
Nesse cenário, inédito, o TSE concluiria que a chapa Dilma-Temer foi eleita de forma irregular em 2014 e deve ser cassada. Temer, portanto, perderia o mandato.
A data da conclusão do caso é importante porque se a chapa eleita for cassada até o final do ano de 2016, o Congresso teria de convocar novas eleições. Se a cassação ocorrer depois disso, a escolha do novo presidente acontece de forma indireta, por meio do voto de deputados e senadores.
Para o advogado de Dilma, “tudo leva a crer” que o processo terminará no primeiro semestre de 2017.
O passo a passo
ESTÁGIO ATUAL
O TSE está terminando de coletar o depoimento de testemunhas. Já foram ouvidas 25 testemunhas de acusação e seis de defesa. Edinho Silva, tesoureiro da campanha de Dilma em 2014, foi ouvido na segunda-feira (7). Na quarta-feira (9), Giles Azevedo, também foi ao TSE prestar depoimento. Ambos negaram irregularidades na campanha.
O QUE VEM DEPOIS
Segundo o advogado Flávio Caetano, faltam ser ouvidas duas testemunhas solicitadas pela defesa. Em seguida, será aberta possibilidade para ouvir testemunhas que sejam indicadas pela defesa de Temer.
A Corte também deve receber nos próximos dias a quebra do sigilo bancário das gráficas Red Seg Gráfica, Focal e Gráfica VTPB, que prestaram serviços à campanha de Dilma e Temer em 2014.
O ex-presidente da empreiteira Andrade Gutierrez, Otavio Azevedo, será ouvido novamente pelo tribunal na quinta-feira (17).
Encerrados os depoimentos e a chegada dos documentos, o ministro Herman Benjamin analisará o conjunto do material e abrirá prazo para as partes envolvidas apresentarem suas alegações finais sobre o caso. Em seguida, ele elabora seu voto e comunica ao presidente do TSE, Gilmar Mendes, que o processo está pronto para ser julgado pelo plenário da Corte.
DEPOIS, AINDA TEM O SUPREMO
É a primeira vez que o Tribunal Superior Eleitoral analisa se cassa ou não o mandato de um presidente da República. Independentemente da decisão, deve haver recurso das partes ao Supremo Tribunal Federal, que dará a palavra final sobre o caso.
Via: www.nexojornal.com.br